domingo, 4 de setembro de 2016

Rodeios: cultura e esporte ou prática cruel e desprovida de identidade?

Rodeios: cultura e esporte ou prática cruel e desprovida de identidade?

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por Renata de Freitas Martins - Advogada Ambientalista

Introdução


Este mês escolhemos abordar o tema “rodeio” na ColunaJUR, tendo-se em vista a estréia de novela em horário nobre que irá trazer entre seus mocinhos os cowboys de rodeios, o que com certeza acaba influenciando milhões de pessoas para a prática dos rodeios, não apenas no país, mas também fora dele, já que a televisão, em especial o canal que abordará o tema de forma glamourizada, trata-se de um grande meio de manipulação de massas, de alcance mundial, e capaz, inclusive, de eleger presidente, causar o impeachment deste mesmo presidente e por assim por diante. 

Para aqueles que apóiam os rodeios, é disseminado que se trata de esporte e atividade cultural, não havendo maus-tratos aos animais, os quais são muito bem tratados e alimentados, e que saltam “loucamente” por conta de cócegas causadas pelo sedém e porque são animais chucros. 

Já os que repugnam essas atividades buscam seus embasamentos em maus-tratos a que os animais são submetidos para que satisfaçam as expectativas dos humanos que os utilizam bem como de seus respectivos telespectadores e da indústria sertaneja (ou será country?) que se fortalece às custas destes eventos, bem como na falta de verdadeira identidade cultural com os rodeios. 

Mas enfim, qual dos grupos será o detentor da razão? É o que veremos a seguir. 

Origem dos rodeios


No século XVII, logo após a vitória do EUA na guerra contra o México, os colonos norte-americanos adotaram alguns “costumes” de origem espanhola e praticadas à época pelos mexicanos, especialmente as festas e a doma de animais, os quais eram rodeados (rodeio provém do espanhol rodear, significando juntar o gado). 

Com o passar do tempo, o rodeio foi adquirindo as características que conhecemos hodiernamente, tendo sua prática sido desenvolvida e incentivada nos EUA, no final do século XIX, onde boiadeiros exibiam suas “proezas” e com isso ganhavam status e apostas, tendo a cidade de Colorado sediado a primeira prova de montaria no ano de 1869 e entre 1890 e 1910 o rodeio surgindo como entretenimento público (?) em vários eventos do Oeste, celebrações de ação de graças e convenções pecuárias. 

Apesar da origem norte-americana, até mesmo por lá esta prática não tem sido considerada cultural, havendo, inclusive, cerca de 15 cidades que já proíbem essas práticas em seu território, entre elas Fort Wayne (Indiana) e Pasadena (Califórnia). 

Aqui no Brasil, diferentemente do que dito por muitos, a prática do rodeio nada tem de cultural, tratando-se de uma cópia do modelo norte-americano, já que os primeiros bovinos criados por aqui eram da raça caracu, que são animais pesados e com enormes “guampas”, sendo impossível sua utilização para fins de rodeios. 

A exemplo dos EUA, também já existem diversas cidades brasileiras com realização proibitiva à realização de rodeios em seus limites, como, por exemplo, São Paulo (SP), Rio de Janeiro (RJ), Sorocaba (SP), Guarulhos (SP), Jundiaí (SP), Campinas (SP) etc. Há, ainda, diversas ações judiciais julgadas procedentes, impedindo-se a realização de rodeios nas comarcas onde foram impetradas e/ou impedindo-se a utilização de instrumentos considerados cruéis (sedém, peitera, esporas etc.). 

Os animais nos rodeios


Nos rodeios são utilizados bovídeos, eqüinos e até mesmo caprinos, todos expostos à pretensa dominação do ser humano, que se utiliza de diversas artimanhas e apetrechos para que o animal pareça bravio e então seja domado pelos valentes peões (ou será cowboys?). 

Dentre os instrumentos mais utilizados para que os animais corcoveiem, há alguns que são visíveis por todos os presentes: 

- Sedém: 

Espécie de cinta, de crina e pêlo, que se amarra na virilha do animal e que faz com que ele pule. 

Momentos antes de o brete ser aberto para que o animal entre na arena, o sedém é puxado com força, comprimindo ainda mais a região dos vazios dos animais, provocando muita dor, já que nessa região existem órgãos, como parte dos intestinos, bem como a região do prepúcio, onde se aloja o pênis. 

Há, inclusive, diversos laudos comprovando os maus-tratos aos animais submetidos à utilização do sedém, como veremos em tópico a seguir, e desmistificando o dito por aqueles que são favoráveis aos rodeios, de que o sedém provoca apenas cócegas. 

Aliás, mesmo que considerássemos que o sedém cause apenas cócegas, devemos ressaltar a definição de cócegas como sendo “uma sensação particular, irritante, que provoca movimentos espasmódicos”. Portanto, mesmo que apenas as cócegas fossem causadas, por si só já caracterizam os maus-tratos. 

Importante também dizermos que sedém macio, como o trazido no bojo da Lei n.º 10.519/02, que dispõe sobre a promoção e a fiscalização da defesa sanitária animal quando da realização de rodeio e dá outras providências, não evita o sofrimento dos animais, já que a região onde são colocados são extremamente sensíveis, e, portanto, inócua essa tentativa de minimização dos efeitos de danos que os sedéns causam aos animais. 

Finalmente, lembremos que diferentemente do que dizem, não é durante apenas os 8 segundos de montaria que o sedém é comprimido no animal. Oito segundos é o tempo que o peão deve permanecer no dorso do animal, porém deve-se lembrar que o sedém é colocado e comprimido tempos antes do animal ser colocado na arena (ainda no brete) e também tempos depois da montaria. Além disso, há declarações de peões de que treinam de 6 a 8 horas diárias, portanto, todo este tempo o animal estará sendo maltratado. 

- Esporas: 

As esporas são objetos pontiagudos ou não, acoplados às botas dos peões, servindo para golpear o animal (na cabeça, pescoço e baixo-ventre), fazendo, em conjunto com o sedém e outros instrumentos, com que o animal corcoveie de forma intensa. Além disso, quanto maior o número de golpes com as esporas, mais pontos são contados na montaria. 

Sem fundamento o argumento de que as esporas rombas (não pontiagudas) não causam danos físicos nos animais, pois ocorre a má utilização destes instrumentos, e como dissemos anteriormente, visa-se golpear o animal e, portanto, com ou sem pontas, as esporas o machucam, normalmente provocando cortes na região cutânea e perfuração no globo ocular. 

- Peiteira: 

Consiste em uma corda ou faixa de couro amarrada e retesada ao redor do corpo do animal, logo atrás da axila. A forte pressão que este instrumento exerce no animal acaba causando-lhe ferimentos e muita dor também. 

- Polaco (sinos): 

Na peitera são colocados sinos, os quais produzem um barulho altamente irritante ao animal, ficando ainda mais intenso a cada pulo seu. 

Aliás, ressaltemos que a irritação que o polaco causa aos touros é inclusive reconhecida pelos próprios apreciadores e praticantes de rodeios, já que é definido em sites do gênero como: “sinos de metal colocados no touro para irritá-lo” (sic). 

Existem ainda alguns apetrechos e métodos utilizados para colaborar com as “acrobacias” dos animais que são utilizados nos bastidores de rodeios, sem que muitas pessoas tenham acesso visual, além da situação estressante que os animais são submetidos nos momentos que antecedem sua entrada nas arenas. Dentre eles podemos citar: 

- objetos pontiagudos: pregos, pedras, alfinetes e arames em forma de anzol são colocados nos sedenhos ou sob a sela do animal; 

- choques elétricos e mecânicos: aplicados nas partes sensíveis do animal antes da entrada à arena; 

- terebintina, pimenta e outras substâncias abrasivas: são introduzidas no corpo do animal antes que sejam colocados na arena, para que fiquem enfurecidos e saltem. As substâncias abrasivas em contato com cortes e outros ferimentos no corpo do animal causa uma sensação de ardor insuportável; 

- golpes e marretadas: na cabeça do animal, seguido de choque elétrico, costumam produzir convulsões no animal e são os métodos mais usados quando o animal já está velho ou cansado, com a finalidade de provocar sua morte. 

- descorna: o chifre dos bovídeos, para a realização de determinadas provas, é “aparado” com a utilização de um serrote, sem anestésico, e causando sangramentos e dor aos animais; 

- transporte dos animais: os animais são transportados em minúsculos espaços, e para que embarquem ou desembarquem dos caminhões, são obrigados a passarem por rampas, sendo que muitas vezes os animais escorregam e se fraturam neste ato; 

- brete: é o local onde ficam confinados os animais antes da prova e onde são preparados para montaria. Neste momento o animal passa por uma situação enorme de estresse, tendo-se inclusive sérios estudos a respeito, como veremos em item a seguir. 

- alimentação: na maioria das vezes, os animais recebem sim boa alimentação, mas não deixemos que este fato nos engane, achando que por este motivo os animais são bem tratados. Na verdade, o animal, para entrar bem na arena e cumprir sua “função”, tem que estar forte e com uma aparente saúde física boa, por isso não há como não lhe prover boa alimentação e o mínimo de cuidados. Porém, com certeza isso não anula os maus-tratos que já reportamos anteriormente. 

Modalidades praticadas nos rodeios


Além dos métodos e apetrechos utilizados para incitar o animal a corcovear e a correr de forma voraz dentro das arenas que já citamos, mister sabermos ainda quais são as modalidades que se praticam nos rodeios, para que entendamos os maus-tratos aos animais praticados em cada uma delas. 

A seguir trazemos as modalidades segundo a Federação Nacional de Rodeio Completo: 

- bull riding: montaria em touro. O animal é esporeado, especialmente na região do baixo-ventre; 

- laçada de bezerro (calf roping): animal de apenas 40 dias é perseguido em velocidade pelo cavaleiro, sendo laçado e derrubado ao chão. Ocorre ruptura na medula espinhal, ocasionando morte instantânea. Alguns ficam paralíticos ou sofrem rompimento parcial ou total da traquéia. O resultado de ser atirado violentamente para o chão tem causado a ruptura de diversos órgãos internos levando o animal a uma morte lenta e dolorosa; 

- laço em dupla (team roping): dois cowboys saem em disparada, sendo que um deve laçar a cabeça do animal, e o outro as pernas traseiras. Em seguida os peões esticam o boi entre si, resultando em ligamentos e tendões distendidos, além de músculos machucados; 

- bulldogging: dois cavaleiros, em velocidade, ladeiam o animal que é derrubado por um deles, segurando pelos chifres e torcendo seu pescoço; 

- bareback: montaria em cavalo, em que o peão se coloca em posição quase horizontal, devendo "marcar o animal" logo no primeiro pulo, posicionando as duas esporas no pescoço do cavalo; 

- sela americana (saddle bronc): montaria em cavalo em que é preciso "marcar o animal" posicionando-se as esporas no pescoço do animal logo no primeiro pulo e no segundo pulo o peão deve puxar as esporas seguindo uma angulação que sai da paleta, passa pela barriga e chega até o final da sela, na traseira do cavalo. Quanto maior a angulação, maior a nota. 

- cutiano: montaria em cavalo, em que o peão fica apoiado unicamente em duas cordas que são amarradas à peiteira, fazendo com que o animal sofra ainda mais a compressão causada por esse instrumento. No primeiro pulo, o peão posiciona as esporas entre o pescoço e a paleta. A partir do segundo pulo, as esporas devem ser puxadas em direção à cava da paleta. Quanto mais esporeadas forem dadas, maiores as chances de se conquistar notas altas. 

Laudos, pareceres, estudos e depoimentos sobre rodeios


São muitas as manifestações de técnicos no que concerne aos maus-tratos ou não aos animais em rodeios. 

Grande parte do material aborda especialmente a questão dos sedéns, sendo que a grande maioria os laudos, estudos e pareceres abominam a utilização deste apetrecho, conforme comprovamos a seguir com a citação de diversos trechos importantes dos documentos em voga. 

A professora Júlia Matera, presidente da comissão de ética da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo, in Parecer Técnico sobre a potencialidade lesiva de sedém, peiteiras, choques elétricos e mecânicos e esporas em cavalos e bois diz: 

“A utilização de sedém, peiteiras, choques elétricos ou mecânicos e esporas gera estímulos que produzem dor física nos animais, em intensidade correspondente à intensidade dos estímulos. Além da dor física, esses estímulos causam também sofrimento mental aos animais, uma vez que eles têm capacidade neuropsíquica de avaliar que esses estímulos lhes são agressivos, ou seja, perigosos à sua integridade”. 

Importantíssimo também serem trazidos à baila os estudo da Dra. Irvênia Luiza de Santis Prada, professora titular emérita de anatomia da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP, in Diversão humana e sofrimento animal – Rodeio: 

“O sedém é aplicado na região da virilha, bastante sensível já por ser de pele fina mas, principalmente, por ser área de localização de órgãos genitais. No caso dos bovinos, o sedém passa sobre o pênis e, nos cavalos, pelo menos compromete a porção mais anterior do prepúcio. 

(...) 

Quanto à possibilidade de produção de dor física pelo uso do sedém, a identidade de organização das vias neurais da dor no ser humano e nos animais é bastante sugestiva de que eles sintam, sim, dor física. O contrário é que na se pode dizer, isto é, nada existe, em ciência, que provem que os animais não sentem dor com tal procedimento. 

(...) 

A identidade de organização morfo-funcional existente entre o sistema nervoso do homem e dos animais é altamente sugestiva de que os animais vivenciem sofrimento físico e mental quando submetidos aos procedimentos do chamado rodeio completo”. 


Em relação às provas de laço, mister citarmos trecho do laudo exarado pelo perito veterinário, Dr. José Lincoln Leite de Campos, nomeado pelo MM. Juízo de Jaguariúna, nos autos da ação popular n.º 649/01, referindo-se à edição de 2003 do Jaguariúna Rodeo Festival: 

“(...) quando fugindo da condição que foi imposta a ele, é laçado [bezerro de 40 dias de idade], sofre um tranco, podendo ocorrer danos no seu pescoço, causando lesões leves, graves ou gravíssimas, reversíveis ou irreversíveis, podendo até leva-los à morte”. 

Complementando perfeitamente o dito pelo ilmo. perito supra-referido, importante mencionarmos o depoimento do médico veterinário E. J. Finocchio, publicado em março de 1990, na revista The Animals Agenda: 

“Testemunhei a morte instantânea de bezerros após a ruptura da medula espinhal. Também cuidei de bezerros que ficaram paralíticos e cujas traquéias foram total ou parcialmente rompidas. Ser atirado violentamente ao chão tem causado a ruptura de diversos órgãos internos, resultando em uma morte lenta e agonizante”. 

Ainda em relação à ação popular anteriormente citada em Jaguariúna, no ano de 2002, o ilmo. sr. perito, Dr. Roberto de Lacerda Russo relata que 

“Alguns cavalos e touros possuíam cicatrizes antigas e recentes, decorrentes do uso de equipamentos como sedéns e esporas. Havia cavalos com cicatrizes na região frontal da cabeça, ocasionadas por traumas ocorridos dentro dos bretes. Tais cicatrizes podiam ser vistas a olho nu e houve filmagem durante as provas em que se constatou que enquanto os animais aguardavam a saída para arena, eram tomados de muito estresse, pois se debatiam com muita freqüência. 

(...) 

Em relação à montaria, constatamos a utilização do sedém e sino. Em alguns peões constatamos a utilização de esporas pontiagudas e serrilhadas nas extremidades. Observamos o uso normal desses equipamentos, mesmo sabendo que já são proibidos por lei”. 


Especi ficamente em relação às provas e à utilização do sedém, afirma o citado perito: 

“As reações à dor são inevitáveis neste caso, não importando o material usado na confecção. A modalidade Bulldog (...) possibilita grave risco de fratura na coluna do animal, deslocamento de vértebras e também rupturas musculares. A modalidade Team Roping (...) possibilitam as lesões físicas similares à modalidade Bulldog, com riscos de óbito. A modalidade Calf Roping (...) foi observado que a parada abrupta do animal possibilita fratura ou deslocamento na coluna, em razão do golpe sofrido, por serem os bezerros jovens e frágeis, com risco de virem à óbito. 

(...) 

Do ponto de vista técnico, observamos lesões externas em alguns animais, principalmente na região inguinal, com pele avermelhada e irritada, decorrente do uso de sedém, mesmo 12 horas após o evento. E também várias cicatrizes sob a forma de cortes na região cutânea do pescoço e baixo ventre, decorrente do uso de esporas, havendo fotos e filmagem para demonstrar tal fato.” 


Sobre as conseqüências dos constantes maus-tratos aos animais de rodeio, marcante o dito pelo Dr. C. G. Harber, médico veterinário com trinta anos de experiência como inspetor de carne da USDA, acostumado a receber animais de rodeio destinados para o abate após 10 ou 15 anos de “trabalhos”, em artigo publicado em março de 1990, na revista The Animals Agenda: 

“O pessoal dos rodeios manda seus animais aos matadouros, onde tenho visto gado tão machucado, que as únicas áreas em que a pele continuava ligada eram na cabeça, pescoço e pernas. Tenho visto animais com seis a oito costelas separadas da coluna vertebral e, às vezes, penetrando os pulmões. Tenho visto entre dois e três galões de sangue livre acumulado debaixo da pele solta.” 

Além dos grandes danos físicos causados aos animais nos rodeios, como já expusemos fartamente, devemos ressaltar também o sofrimento a que os animais são submetidos, e para tanto suscitamos mais uma vez a festejada Dr. Irvênia Prada, em seu já citado trabalho: 

“Outro aspecto que nos chama atenção é o que se observa nas fotos dos animais, em plena atividade, nesses eventos. Nessas fotos, os olhos dos animais mostram uma grande área arredondada, luminosa, conseqüente à dilatação de sua pupila. Na presença de luz, a pupila tende a diminuir de diâmetro (miose). Ao contrário, a dilatação da pupila (midríase) acontece na diminuição ou ausência de luz, na vigência de processo doloroso intenso e na vivência de fortes emoções (medo, pânico etc.) e que acompanham situações de perigo iminente, caracterizando o chamado “Síndrome de Emergência de Cânon” (to fight or to flight – lutar ou fugir). 

Quando o ser humano ou o animal se sente ameaçado, agredido, assustado, automaticamente seu organismo é preparado para essa situação. Acontece então taquicardia (aumento da freqüência cardíaca), aumento da pressão arterial, dilatação dos brônquios, aumento de aporte sangüíneo para os músculos, diminuição de sangue no território cutâneo, transformação rápida de glicogênio em glicose e dilatação das pupilas (midríase). No ambiente da arena de rodeio, o esperado seria que os animais estivessem em miose, pela presença de luz. Assim, a midríase que exibem é altamente indicativa de que estejam na vigência do citado Síndrome de Emergência, o que caracteriza sofrimento mental.” 


Neste mesmo sentido o laudo do Dr. José Eduardo Albernaz, perito nomeado pelo MM. Juízo da 1ª Vara Cível de Presidente Prudente, nos autos da ação civil pública n.º 2.098/97, quando indagado pelo ilustríssimo membro do Ministério Público local se, quando posta em risco a integridade dos órgãos dos animais, estes sentem-se ameaçados e sofrem alguma espécie de pânico, medo ou qualquer outro sofrimento mental, bem como o que caracteriza tais ameaças aos animais, tendo-se como respostas: 

“(...) sendo uma região composta de órgãos externos, extremamente sensíveis (testículos, escroto, pênis e prepúcio), com estruturas essencialmente de tecidos de camadas finas, vasos, artérias, veias e nervos, ao serem comprimidos, levam os animais a um estado de medo, pavor, provocados por uma intensidade determinada de dor. 

Podemos caracterizar esse fator como Síndrome de Emergência de Cânon.”
 Finalmente, não poderíamos deixar de citar que existem alguns pouquíssimos laudos que afirmam que os animais nos rodeios não sofrem maus-tratos, entre eles laudos provenientes da UNESP e da Universidade de Uberlândia. Porém, devemos ser enfáticos ao ressaltar que estas instituições promovem o rodeio universitário, e, portanto, são totalmente parciais em relação ao assunto. Em especial a UNESP, cujos laudos foram assinados por professor ligado diretamente aos Independentes de Barretos, considerados sem base científica alguma, quais sejam, o proveniente do Projeto Sedém, pois colheram sêmen de animais não submetidos ao sedém e o proveniente da Avaliação Técnico-Científica da Utilização de Sedém em Bovinos, quando deixaram o sedém apenas envolto na virilha dos animais, sem exercer qualquer compressão, e, portanto, não fazendo o animal corcovear ou se estressar como se na arena estivesse. Cotejando-se os laudos pró com os contra os rodeios, parece-nos não haver dúvidas, não? 

Rodeio é esporte?


Após a promulgação da Lei Federal 10.220/01, que institui normas gerais relativas à atividade de peão de rodeio, equiparando-o a atleta profissional, a assertiva de que rodeios são esportes tornaram-se ainda mais comuns. Mas será tal consideração procedente? 

Para que possamos responder este questionamento, deveremos primordialmente analisar qual o significado do vocábulo “esporte”, que segundo o Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, significa “conjunto de exercícios físicos praticados com método, individualmente ou em equipe”. 

Aprofundando-nos um pouco mais no que é esporte, buscamos ainda uma definição mais técnica, trazida da educação física: “uma atividade metódica e regular, que associa resultados concretos referentes à anatomia dos gestos e à mobilidade dos indivíduos”. 

Levando-se em consideração as citadas definições, fica-nos claro que se considera esporte toda aquela atividade praticada por um indivíduo, dependendo exclusivamente deste ou dos membros de uma equipe. Não há que se falar de esporte em atividades que dependem totalmente de animais para a sua prática. Pior, que depende de maus-tratos a estes animais para que o chamado esporte possa ser praticado. 

Aliás, parece-nos até mesmo um contra-senso, tendo-se em vista que esporte, quando praticado adequadamente, com técnica, é considerado um bem à saúde, é vida, e rodeios são exatamente o oposto: maus-tratos, mutilações, estresse, mortes. 

Rodeios = geração de empregos e de renda?


Comumente vemos como embasamento à defesa dos rodeios o fato destes eventos proverem geração de empregos e de renda, porém mais uma vez somos obrigados a rebater tais argumentos. Vejamos. 

As festas de rodeio envolvem diversas atividades, além das práticas que se utilizam de animais, tais como shows, feiras, parques de diversões, casas noturnas e bares etc., e já é comprovado que a enorme maioria dos freqüentadores destes eventos lá estão por conta de toda essa agitação, e não com o cunho que assistirem às provas envolvendo os animais. 

Assim, o pretendido lucro não ocorre por conta dos animais, e caso fossem realizados estes eventos sem as famigeradas provas, haveria as mesmas conseqüências econômicas, porém sem realizar os maus-tratos aos animais sob os auspícios de geração de renda e de empregos, o que, aliás, já ocorreu em diversos Municípios de São Paulo a que temos conhecimento. 

Ademais, é de suma importância ser ressaltado que todas as atividades ilegais normalmente são extremamente lucrativas, a exemplo do tráfico de drogas, de animais silvestres e comércio ilegal de armas, porém esse lucro não justifica a prática dessas atividades. 

Neste sentido, sempre tão brilhantes as considerações do ilustre Promotor de Justiça Dr. Laerte Fernando Levai, in parecer sobre os rodeios, boletim do IBCCRIM de fevereiro de 2000, apud Cruéis Rodeios – a exploração econômica da dor, de Vanice Teixeira Orlandi: 

“Não se pode aceitar a tortura institucionalizada de animais com base na supremacia do poder econômico, nos costumes desvirtuados ou no argumento falacioso de que sua prática se justifica em prol do divertimento público, sob pena de se adotar a máxima maquiavélica de que os fins justificam os meios”. 

Lembremos finalmente, que o tal lucro que dizem ter por conta dos rodeios é algo que ficará concentrado nas mãos de poucos, e que as conseqüências para as populações locais podem ser desastrosas, pois a cada rodeio realizado em Barretos/SP, por exemplo, o número de crimes aumenta de forma estrondosa (de 10 furtos registrados por mês, sobe-se para 600 durante os poucos dias de evento). Sem contar com a poluição trazida à cidade (muitos carros, música assustadoramente alta, alta produção de lixo etc.), além do prejuízo de serviços básicos à população, faltando água, tendo hospitais lotados de pessoas em coma alcoólico ou machucadas por uma briga de rua e por aí vai... 

Considerações legais e conclusões


Por todo o exposto, dúvidas não há de que a prática de rodeios é inconstitucional e ilegal, aquela por serem totalmente contrárias ao exposto no artigo 225, §1º, VII de nossa Constituição, sendo obrigação do Estado primar pelo ambiente sadio e equilibrado, vedando-se práticas que submetam os animais a crueldades e esta por ferirem especialmente o Decreto “getulista” (24.645/34) e a Lei de Crimes Ambientais, que considera esses atos como crimes de maus-tratos (lei 9.605/98, artigo 32). 

Aliás, falando-se em prática inconstitucional, de se ressaltar que a Lei 10.519/02, que dispõe sobre a promoção e a fiscalização da defesa sanitária animal quando da realização de rodeio e dá outras providências, é totalmente inconstitucional, pois pretende legalizar uma atividade que é condenada em nossa Constituição Federal, já que os maus-tratos e a crueldade cometidos com os animais nos rodeios são indubitáveis. 

Muito pertinente o exposto no acórdão proferido pela 8ª Câmara de Direito Público do TJ-SP, pela Desembargadora Teresa Ramos Marques, apud Levai, Laerte Fernando, in Direito dos Animais, 2 ed., Campos do Jordão: Mantiqueira, 2004. p. 58: 

“Um certo instrumento, ou uma determinada prova, não deixam de ser cruéis simplesmente porque o legislador assim dispôs. Não se desfaz a crueldade por expressa disposição de lei” (Apelação n.º 168.456.5/5-00)


Já passou o tempo da população e de seus representantes no Legislativo, no Executivo e no Judiciário evoluírem e, finalmente, perceberem que a utilização de animais para a satisfação do ego humano é algo totalmente ultrapassado. 

Não há glória alguma em receber aplausos e em incitar uma atividade que gera sofrimento, agonia e até mesmo a morte. 

Queremos VIDA e diversão de forma legítima e legal, e se o ser humano é tão racional e inteligente quanto se gaba ser, não é nada tão difícil de se alcançar, não?! 

DIVERSÃO SIM,
RODEIOS NÃO!


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sábado, 3 de setembro de 2016

Plataforma Mínima de Defesa dos Direitos dos Animais de Curitiba - Eleições 2016



PROPOSTA PARA UMA PLATAFORMA MÍNIMA DE DEFESA DOS DIREITOS DOS ANIMAIS DE CURITIBA
Eleições Municipais 2016
As entidades e movimentos de defesa dos animais de Curitiba apresentam sua plataforma mínima para a defesa e proteção aos animais, propondo políticas públicas efetivas de forma a evitar abandonos, crueldades, maus-tratos, doenças, acidentes, mordeduras, descontrole populacional, o desrespeito, a falta de orçamentos e de estrutura administrativa e enfim, para que possamos nos transformar numa sociedade que prima pelo respeito aos animais e que atenda todos os princípios humanitários, éticos, morais e de promoção de saúde pública, com eficiência e bom uso do dinheiro público.

Assim, propomos:

1-       Implantar uma Política Pública de controle ético de populações de animais urbanos, através da elaboração de programas e projetos em caráter permanentes, massivos, gratuitos, e continuados de castração, por meio de esterilização cirúrgica, prioritariamente, de cães e gatos.

2-       Implantar, de forma efetiva, uma Política Pública de Educação para o respeito à vida de todos os seres, incluindo a Guarda Responsável de Animais, o consumo ético e práticas sustentáveis, o fomento à substituição do uso de animais em atividades didáticas e pesquisas científicas, tanto no âmbito da educação formal, como inserido em todos os níveis e possibilidades educativas da sociedade.

3-       Criar meios para educar a população sobre as consequências para o meio ambiente, para os animais e para a saúde das pessoas, da alimentação baseada em produtos de origem animal; ações concretas como a disponibilização de refeições vegetarianas (100% vegetais) em restaurantes populares.

4-       Criar Política para os Animais Comunitários, propiciando o fortalecimento do convívio equilibrado e respeitoso, com base no princípio da tolerância entre os seres humanos e os animais.

5-       Tornar obrigatório, por meio de legislação, o registro geral de animais, para estimular a responsabilidade e propiciar o levantamento da população de cães, gatos e cavalos nas áreas urbanas.

6-       Fortalecer a fiscalização do comércio e ação inclemente sobre criadouros clandestinos de animais (no território do Município de Curitiba a criação comercial de animais é proibida).

7-       Estimular a adoção responsável, de forma a evitar o abandono, o crescimento populacional desordenado, o tráfico de animais e desestimular a adoção de animais exóticos.

8-       Proibir o comércio de cães e gatos não castrados.

9-       Criar Clinicas/Hospitais Veterinários Municipais para o atendimento gratuito aos animais da população e locais específicos para recuperação de animais doentes ou em pós-operatório, em preparação para adoção

10-   Construir e implementar o Centro de Atendimento a Animais em Situação de Risco –. CRAR, com a finalidade de atender os animais em situação de risco (incluem-se nessa categoria os animais vítimas de abandono e resgatados pela Prefeitura de Curitiba ou encaminhados pela proteção animal, conforme pactos que se estabelecerem).

11-   Fiscalizar, de forma rigorosa, o disposto na Lei 16.101, de 06 de maio de 2009, que “Veda, no Estado do Paraná, a prestação de serviços de vigilância por cães de guarda com fins lucrativos no âmbito do Estado do Paraná.”

12-   Contratar mais servidores para atuar, de forma eficaz e precisa, na fiscalização do cumprimento às legislações vigentes de proteção e defesa dos animais, pois estas possuem caráter educativo, preventivo e punitivo. Além disso, promover a aquisição de veículos e demais instrumentos para a execução dessas tarefas.

13-   Tornar o Município de Curitiba “território não-eutanásico”, com o fim de se fazerem cessar, de vez, as mortes de animais resgatados pelo Centro de Controle de Zoonoses e Vetores, buscando alternativas éticas para a manutenção da vida dos cães considerados não-socializáveis ou não passíveis de adoção pela Comunidade.

14-   Proibir os fogos de artifícios para prevenir o sofrimento causados aos animais que podem levar até à sua morte.

15-   Garantir orçamento para o desenvolvimento das políticas, bem como manter os direitos dos animais já garantidos por legislação no Município de Curitiba.

16-   Melhorar o acesso para a população às informações relativas às políticas planejadas e adotadas referente à Rede de Defesa e Proteção Animal, através de um portal de informações atualizadas e precisas, e criar vias diretas para denúncias e pedidos de urgência.

17-   Autorizar, por meio legal, o transporte municipal e intermunicipal de animais domésticos.

18-   Deixar de manter animais confinados para entretenimento e visitação, transformando o Zoológico de Curitiba em Santuário de Animais e paulatinamente deixar de manter animais em cativeiro no Passeio Público de Curitiba.

19-   Adotar medidas de preservação de espécies nativas, silvestres, sinantrópicas e exóticas, pautadas na recusa ao extermínio, privilegiando-se o manejo adequado dos espécimes. Adotar medidas, programas e ações que protejam os biomas naturais, habitat das inúmeras espécies da nossa fauna nativa, evitando o corte de árvores que acolham e sirvam de alimentos a aves, pequenos roedores, entre outros. Incentivar a preservação de áreas verdes através do fortalecimento das reservas naturais particulares; implantação de corredores de biodiversidade no Município ligando os diversos parques municipais e as reservas particulares e incentivo à adoção dos mesmos princípios na Região Metropolitana de Curitiba.  E por fim, adotar meios de proteção de todos os corpos hídricos (nascentes, rios, lagos, lagoas, etc.) e promover a recuperação dos mesmos.
  
20-   Integrar as políticas de proteção e defesa dos animais por meio de ações conjuntas com os municípios da Região Metropolitana de Curitiba.

Assinam o presente documento:

Amigos dos Animais
Associação Arca de Noé de Proteção Animal
Associação Beneficente Salva Bicho Curitiba
Associação do Amigo Animal
AVAN – Associação Vida Animal
Beco da Esperança
Coletivo Patinhas Pinhais
ECOFORÇA Ambientalista
Instituto de Proteção Animal e de Exercício de Cidadania – IPAEC
Movimento SOSBICHO de Proteção Animal
Quatro Patas Grupo de Proteção Animal
Sociedade Protetora dos Animais de Curitiba – SPAC

E Ativistas Independentes

Com o Apoio:

Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal – FNPDA
Instituto Abolicionista Animal - IAA
Instituto Técnico de Educação e Controle Animal – ITEC
Sociedade Vegetariana Brasileira
World Animal Protection Brasil


O Fórum de Defesa dos Direitos dos Animais de Curitiba e Região está aberto para diálogos com os candidatos.

Plataforma Mínima de Defessa dos Direitos dos Animais de Curitiba - Eleições 2016


quinta-feira, 1 de setembro de 2016

Os animais de estimação no contexto da Lei de Crimes Ambientais

Grafite do artista Ricardo Horstman executado no Colégio Estadual Guido Straube


Atualmente a procura por animais de estimação cresce exponencialmente. Alguns estudos apontam que a presença deles pode auxiliar no combate à solidão, além de reduzir a ansiedade e a depressão. Eles também podem atuar como um incentivo à prática de atividades físicas, promover interações sociais e aumentar os níveis de endorfina no organismo, o hormônio que causa prazer e sensação de bem-estar. Algumas pesquisas ainda sugerem que, ao cuidarem de animais de estimação, as crianças tendem a crescer mais seguras e decididas em suas escolhas.

Mesmo com todos os benefícios provenientes dessa relação, muitos animais de estimação vêm sendo vítimas de diversas formas de agressão cometidas por seus proprietários. Não há dados oficiais sobre maus tratos contra animais no Brasil, porém podemos verificar, com certa frequência, relatos nos meios de comunicação sobre a crueldade sem justificativa. Presenciar a violência pode gerar muita revolta e aí pode surgir a dúvida sobre como agir e a quem recorrer nestas situações.

De acordo com a Lei de Crimes Ambientais (Lei 9.605, de 12 de fevereiro de 1998), constitui-se em crime ambiental passível de detenção de três meses a um ano e de multa “praticar ato de abuso, maus tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos”. É dever de cada cidadão, ao presenciar tais atos, denunciá-los por meio das delegacias de polícia ou pela internet.

Mas a legislação não tem sido respeitada. Um exemplo que ganhou destaque na mídia em 2013 foi o caso do Instituto Royal, que utilizava 178 cães da raça Beagle para testes da indústria farmacêutica. O próprio instituto, na época, se manifestou dizendo que atendia as normas da ANVISA, mas esqueceu da Lei de Crimes Ambientais, ou não teve as orientações adequadas. As autoridades pouco podem fazer se não houver denúncia por parte da população e infelizmente essa prática, em alguns países, é vista como normal. Um dos países que se diz o mais democrático do mundo, os Estados Unidos, utiliza espécies de primatas como gorilas e chipanzés para testes de vacinas, e a China, onde  é comum o consumo de carne de cães, também tem muitos casos de maus tratos utilizando as peles destes animais.

Por aqui, podemos dizer que o Brasil avançou muito nos últimos anos, com a legislação e as campanhas de sensibilização com a finalidade de evitar agressões contra animais domésticos. Mas precisamos ir além. Campanhas de adoção de animais abandonados, criação de centros de zoonoses, castração, entre outros têm formado uma consciência de cuidado e respeito aos animais. Em uma visão biocêntrica de homem e natureza, cada um tem sua importância no planeta e na perpetuação de todas as espécies.

Este artigo foi produzido pela equipe de Gestão Ambiental do Centro Universitário Internacional Uninter, dos professores André Maciel Pelanda, Augusto Lima da Silveira, Rodrigo Berté e Rodrigo Silva.