César Machado/Vale Press
95% das prefeituras do Brasil não entregaram o plano de gestão do lixo
Municípios que descumprirem a lei de resíduos sólidos não poderão pleitear recursos federais. A maioria das cidades do Paraná está atrasada
Publicado em 25/09/2012 | RAPHAEL MARCHIORI, ESPECIAL PARA A GAZETA DO POVO
A menos de dois anos do prazo final para a eliminação de todos os lixões do país, apenas 283 municípios já apresentaram seus planos de gestão de resíduos sólidos ao Ministério do Meio Ambiente – nenhum deles do Paraná. Isso significa que, no momento, 95% das cidades brasileiras não podem pleitear recursos federais destinados ao setor, como os do Plano Nacional de Resíduos Sólidos, que prevê R$ 1,5 bilhão para implantação de aterros sanitários e sistemas de coleta seletiva.
Segundo a Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Sema), 135 municípios paranaenses informaram que já têm seus programas prontos e outros 90 estão em fase de elaboração. Outros 64 disseram que nem sequer começaram a pensar no assunto e 109 ainda não responderam ao questionário presente em um sistema on-line da secretaria.
Obrigação
Municípios paranaenses com IDH europeu já cumpriram a lei
Municípios paranaenses com Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) similar à de economias de médio porte da Europa já têm prontos seus planos de gestão de resíduos sólidos, conforme informações coletadas pela Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Sema).
Dentre as 135 cidades que se encaixam nessa lista, mas que ainda não entregaram seus projetos ao Ministério do Meio Ambiente, estão Curitiba, Pato Branco, Maringá, Palotina, Toledo, Londrina e Cascavel – cidades com IDH superior a 0,81, índice igual ou maior do que o de países como Lituânia, Polônia e Hungria.
Cascavel, por exemplo, já tem aterro sanitário municipal desde 1995 e serviço de coleta seletiva de lixo. A prefeitura diz ter protocolado há três anos o seu plano na Sema, mas desconhecia a necessidade de enviá-lo ao governo federal.
“Nem sabia que era obrigatório entregar [o plano] para o ministério, mas o município tem o plano, englobando toda a destinação final e adequada de todos os resíduos, inclusive da construção civil e aqueles considerados perigosos”, diz Elmo Rowe Júnior, que assumiu recentemente a Secretaria do Meio Ambiente de Cascavel. (RM)
Funasa
União vai lançar primeiro edital para distribuir verba até o fim do ano
Os recursos para implantação dos planos de gestão de resíduos sólidos ainda não começaram a ser distribuídos, mas as prefeituras que não enviaram seus documentos ao Ministério do Meio Ambiente podem começar a sentir falta dessa verba nos próximos meses. A Fundação Nacional de Saúde (Funasa) vai distribuir R$ 38 milhões neste ano para financiamento de projetos de implantação de aterro sanitário, construção de galpão de triagem e para financiamento de aquisição de equipamentos e veículos coletores. O órgão, ligado do Ministério da Saúde, diz ter recebido 585 propostas, sendo 185 solicitando elaboração de projetos, como planos de gestão de resíduos sólidos, 369 para aquisição de equipamentos ou construção de aterros e galpões de triagem e 31 para serviços que não são financiáveis.
Segundo o edital para distribuição dos recursos, apenas municípios com planos de gestão de resíduos já entregues poderão receber verbas para a aquisição de equipamentos. A entidade, porém, ainda não concluiu a seleção dos pleitos e, por isso, não informou quantas cidades perderão repasses por não terem projetos prontos. (RM)
R$ 1,8 milhão
Os recursos que serão disponibilizados para a consultoria de projetos de gestão de resíduos sólidos variam de R$ 600 mil para planos intermunicipais até R$ 1,8 milhão, para regiões metropolitanas. Já os planos estaduais receberão até R$ 1,7 milhão. Ainda foram definidas faixas especiais para sedes da Copa de 2014 e cidades próximas. As sedes dos jogos poderão receber até R$ 1,4 milhão para consultoria e as cidades próximas com até 100 mil habitantes devem receber até R$ 100 mil e aquelas com mais de 500 mil moradores receberão até R$ 600 mil.
TCE-PR aponta falhas na fiscalização de aterros
Um relatório produzido por auditores do Tribunal de Contas do Paraná (TCE-PR) entre agosto e outubro do ano passado indicou que é baixa a capacidade do Instituto Ambiental do Paraná (IAP) de assegurar a mensuração dos impactos ambientais de aterros e lixões do estado. Dentre os principais problemas estariam falta de funcionários, falhas na captação de servidores, sucateamento de frota, ausência de planejamento de fiscalização e monitoramento deficiente de aterros e lixões. Além disso, nos municípios visitados pelos auditores foram encontrados mais lixões do que o informado pelo IAP (39 ante 18). No total, são 97 vazadouros a céu aberto no estado. O relatório ainda apontou que a maioria dos aterros ou não teria licença ambiental ou estaria com o documento vencido. À época da produção do levantamento, de 340 aterros, 76 (22%) não tinham a autorização emitida pelo IAP e 146 (43%) sequer tinham a licença.
Em relatório posterior publicado pelo próprio TCE-PR, o órgão afirma que o diretor presidente do IAP, Luiz Tarcisio Mossato Pinto, ressaltou a importância da auditoria e que as principais críticas do documento já estariam sendo sanadas com a contratação de funcionários, a aquisição de veículos e a elaboração de uma resolução estadual, estabelecendo critérios para licenciamento e outorga de aterros sanitários.
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Dificuldades
O atraso na entrega dos planos evidencia a dificuldade para se extinguir os lixões no país, conforme determina a Lei 12.305, de agosto de 2010.
De acordo com o relatório Panorama dos Resíduos Sólidos no Brasil, de 2011, produzido pela Associação Brasileira de Empresa Pública e Resíduos e Resíduos Espaciais (Abrelpe), dos 5.565 municípios brasileiros, 3,371 deles ainda destinam seus resíduos para lixões (1.607) ou aterros controlados (1.764) – áreas geralmente sem projetos e precárias para o tratamento de gases. No ano passado, 11 milhões de toneladas de lixo foram parar em lixões no país – quase 297 mil toneladas só no Paraná.
“Decorrido tanto tempo da promulgação da lei, hoje estou extremamente preocupado com esse objetivo”, afirma João Gianesi Netto, vice-presidente da Associação Brasileira de Resíduos Sólidos e Limpeza Urbana (ABLP).
A opinião é endossada pela advogada Fabiana Atallah, membro da Comissão de Direito Ambiental da seção Paraná da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-PR). “Não acredito que vá acontecer [o fim dos lixões] até 2014. De qualquer forma, o que vejo de bom é que todos começaram a se mexer e, se acontecer até 2020, é melhor do que nada”, diz ela, que é especialista em Direito Ambiental e em Gestão e Estratégica da Sustentabilidade.
Falta capacitação
Segundo Cláudia Ruberg, urbanista e doutora em Gestão de Resíduos Sólidos pela Universidade de São Paulo (USP), um dos problemas é a escassez de profissionais com domínio sobre o tema nas prefeituras, principalmente nas menores. “Essa falta de profissionais dificulta a elaboração e implantação de planos. Mesmo quando há a contratação de empresa para elaborar o plano, por vezes os técnicos da prefeitura não sabem avaliar o documento e verificar se ele atende às necessidades.”
Para Carlos Garcez, coordenador de Resíduos Sólidos da Sema, a ausência do Paraná na lista das 283 cidades em dia com o Ministério do Meio Ambiente não configura uma falta de qualidade na gestão de resíduos no estado. “Acredito que 60% dos municípios paranaenses já tenham o plano por conta dos consórcios que agregam muitos municípios. O plano de regionalização, inclusive, tem como objetivo sugerir 18 consórcios no estado”, explica. Segundo ele, a maior carência de aterros sanitários hoje está na Região Centro-Sul do estado, que engloba as microrregiões de Guarapuava, Palmas e Pitanga.
No PR, 64 cidades estão na estaca zero
Embora ricas e populosas, São José dos Pinhais (Grande Curitiba) e Foz do Iguaçu (Oeste do estado) estão entre as 64 cidades que informaram à Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Recursos Hídricos que nem sequer começaram a elaborar seus planos de gestão de resíduos sólidos. A dupla se destaca nessa relação pelo tamanho da população (cada uma tem mais de 200 mil habitantes) e por ter Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) acima das médias nacional e paranaense (0,796 em São José e 0,788 em Foz).
Apesar disso, a situação do lixo em São José e Foz não chega a ser caótica como em outros municípios. Relatório do Tribunal de Contas do Paraná (TCE-PR) informa que os resíduos sólidos dos dois municípios têm como destino aterros sanitários impermeabilizados e com tratamento de gases.
Política nacional
O Plano Nacional de Resíduos Sólidos não propõe apenas a eliminação dos lixões do país, mas também a implantação de coletas seletivas eficazes, mecanismos de inclusão de catadores e programas de logística reversa para grandes geradores de lixo. No documento que formaliza o plano estão previstos cenários favorável, intermediário e desfavorável. Na previsão mais equilibrada, o governo propõe, por exemplo, que até 2031 seja reduzida em 70% a quantidade de resíduos reciclados que hoje ainda têm como destino os aterros sanitários.
Outros 89 municípios informaram ao governo do estado que estão em fase de elaboração de projetos. Entre eles, cidades com mais de 100 mil habitantes e também com IDH acima das médias nacional e estadual, como Ponta Grossa, Apucarana e Pinhais. O prazo para a entrega dos planos sem prejuízo de repasse de recursos federais expirou no último dia 2 de agosto.
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