Grupo acha nova ave em serra de Minas
Pedreiro-do-espinhaço, que tem tamanho de sabiá e vive a 50 km de Belo Horizonte, não era conhecido pela ciênciaAnálise de DNA e do canto confirmou que se trata de espécie única; parente próximo está a mais de 1.000 km, no RS
Guilherme Freitas/Divulgação | ||
Pedreiro-do-espinhaço com anilha metálica na pata, o que ajuda a monitorar deslocamentos do bicho |
EDITOR DE “CIÊNCIA+SAÚDE”
Vasculhando montanhas com cerca de 1.500 m de altitude no coração de Minas Gerais, pesquisadores encontraram uma nova espécie de pássaro, mais ou menos do tamanho de um sabiá (embora seu "primo" mais conhecido seja o joão-de-barro).
A ave, apelidada por eles de pedreiro-do-espinhaço, é um enigma evolutivo: seus parentes mais próximos, que também gostam de montanhas e de frio, estão a milhares de quilômetros dali, no Rio Grande do Sul, nos Andes e até na Patagônia.
Enquanto tentam entender como o bicho foi parar na serra do Espinhaço, a apenas 50 km de Belo Horizonte, os cientistas também estão levando em conta considerações mais práticas. Para eles, a espécie já está "nascendo" para a ciência como ameaçada de extinção.
É que o habitat do animal, uma combinação única de rocha e vegetação rasteira adaptada a altitudes elevadas, corre o risco de sumir com a mudança climática, além de sofrer a pressão da atividade humana.
É OU NÃO É?
A pesquisa que levou à descoberta da nova espécie é assinada pelo ornitólogo Guilherme Freitas e por colegas como Fabrício Santos e Marcos Rodrigues, todos da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais).
A equipe levou vários anos para cravar que se tratava de um bicho novo, em parte, porque as diferenças entre o pedreiro-do-espinhaço e seus parentes da região Sul (que moram na serra Geral, entre o Rio Grande do Sul e Santa Catarina) são pequenas.
Freitas conta que a descoberta começou com o avistamento de um único indivíduo, em 2006. "Bati umas fotos e achei que só podia ser ele [a espécie do Sul]." Talvez fosse um pássaro especialmente aventureiro, tendo voado uns 1.000 km rumo ao norte, pensou o ornitólogo.
Procura que procura, ele e seus colegas foram achando mais bichos, até toparem com casais e filhotes, sinal de que se tratava de uma população residente, e não de alguns pássaros desgarrados.
A equipe conseguiu capturar alguns exemplares e gravar o canto dos pássaros. Análises comparativas da aparência, do padrão de canto e do DNA dos animais levou os pesquisadores a acreditarem, que, de fato, tratava-se de uma espécie nova.
"As diferenças são sutis. Mas, somadas, fortalecem essa hipótese", diz Freitas.
NÁUFRAGO
É difícil saber como a nova espécie acabou evoluindo. É possível que áreas mais baixas fossem propícias à sua presença dezenas de milhares de anos atrás, na Era do Gelo. Conforme o planeta esquentou, a população da serra do Espinhaço teria ficado isolada e adquirido suas características únicas.
Por outro lado, sua origem pode ser ainda mais remota. "As montanhas brasileiras são antigas se comparadas aos Andes, e há vários registros de 'fósseis vivos' no Espinhaço", diz Freitas.
O habitat peculiar da ave são os chamados campos rupestres, terrenos pedregosos repletos de plantas herbáceas e frequentemente cobertos por neblina, formada pela umidade que vem do mar.
Nesse ambiente, o pedreiro-do-espinhaço caça invertebrados em meio a rachaduras na rocha, musgos, líquens e gramíneas.
A descrição científica oficial da espécie será publicada na edição do mês que vem da revista científica "Ibis", especializada em ornitologia.
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